Diferenças entre a dieta enteral caseira e a industrializada
Dentre as principais preocupações médicas quanto ao tratamento e recuperação de pacientes, a nutrição é uma das questões mais relevantes – a oferta adequada de nutrientes pode influenciar não apenas na resposta terapêutica, mas também no tempo do tratamento.
Quando o paciente apresenta alguma dificuldade de engolir, deglutir ou digerir os alimentos normalmente, mantê-lo devidamente nutrido pode exigir o uso de terapias nutricionais alternativas. Dentre elas, a dieta enteral, mais conhecida como alimentação por sonda, é um dos métodos mais eficazes. A técnica, que pode ser aplicada em caráter temporário ou definitivo, busca garantir a oferta de vitaminas, sais minerais e demais nutrientes ao paciente com dificuldades de obtê-los através da alimentação oral.
Muitas vezes o método precisa ser continuado mesmo após a alta hospitalar para auxiliar na recuperação do paciente e reduzir o risco de desnutrição. Neste momento, muitas dúvidas podem surgir tanto para o paciente quanto para cuidadores e familiares que vão auxiliar nos cuidados caseiros. Adotar uma dieta artesanal, preparada em casa, é mais saudável do que o uso de produtos industrializados? Diversos pontos devem ser analisados para determinar qual a melhor opção tanto para o paciente quanto para os envolvidos no tratamento.
Basicamente, existem dois tipos de dieta enteral: a artesanal e a industrializada. Ambas são capazes de contemplar todas as necessidades nutricionais do indivíduo em tratamento por sonda:
Dieta artesanal: Também conhecida como caseira ou manipulada, esta dieta é preparada com os alimentos comuns do dia a dia, in natura. Seguindo as orientações do nutricionista, o alimento deverá ser preparado, batido no liquidificador ou processador, coado e peneirado de forma que se obtenha um líquido suficientemente ralo e homogêneo, afim que a dieta possa ser ofertada via sonda. Em alguns casos, é recomendado o uso de algum tipo de suplemento vitamínico, calórico ou proteico afim de complementar o aporte nutricional dessa dieta.
Dieta industrializada: As dietas enterais comercializadas se resumem a produtos prontos para serem servidos, com aporte nutricional balanceado, especialmente desenvolvido para atender necessidades ou restrições alimentares específicas. São encontradas nas seguintes formas:
- Em pó: dietas que devem ser diluídas ou dissolvidas em água antes de transferidos para o frasco descartável;
- Líquida: dieta completa e pronta para ser administrada. Pode ser encontrada em Sistema Fechado, normalmente utilizada por hospitais e clínicas; e Sistema Aberto – embalagens longa vida que devem ser envasadas em frasco descartável, conforme a orientação do nutricionista, antes de serem ofertadas ao paciente;
Por se tratar de uma terapia nutricional, a dieta enteral, independente da forma de administração, é indicada exclusivamente por profissionais de saúde: somente médicos e nutricionistas podem prescrever e elaborar um plano específico que atenda às necessidades individuais do paciente.
É muito comum que pacientes sob dietas enterais possuam necessidades nutricionais específicas, precisando de uma oferta qualificada de determinados nutrientes. Algumas restrições alimentares também podem impactar diretamente sob a elaboração dessa dieta. De acordo com a nutricionista Joanna Lima, da Nova Nutrii, esses fatores são determinantes para o tratamento. “A alimentação enteral, apesar de segura, é muito mais delicada do que a alimentação oral. Logo, se a dieta convencional já requer uma atenção quanto as restrições e necessidades individuais do paciente, esses cuidados devem ser redobrados na dieta enteral em domicílio”. Portanto, atentar para as recomendações médicas quanto a especificação da dieta é fundamental para assegurar o tratamento. Normalmente, os indivíduos alimentados por sondas podem ter uma dieta elaborada visando:
Maior oferta de proteínas: quando o paciente precisa evitar a perda ou recuperar massa muscular, a dieta hiperproteica é a mais indicada para fornecer ao organismo nutrientes necessários para a manutenção desses tecidos;
Maior oferta de carboidratos: a dieta hipercalórica também é indicada para a recuperação de peso e maior oferta de energia. Em alguns casos pode ser utilizada em conjunto com a dieta hiperproteica, especialmente em casos de perda de peso acentuada
Controle glicêmico: pacientes diabéticos necessitam de uma dieta qualificada quanto ao consumo de carboidratos e devem seguir dietas isentas de sacarose. Como precisam manter o a glicemia sob controle, a oferta de alimentos deve ir de acordo essas restrições;
Manutenção da saúde do idoso: naturalmente, a terceira idade requer atenção especial quanto ao aporte nutricional. Além da perda de massa magra própria da idade, o organismo possui maior dificuldade em absorver os nutrientes da dieta. Quando o idoso precisa seguir uma dieta enteral, necessidades proteicas, calóricas, vitamínicas e de sais minerais devem ser analisadas com um cuidado ainda maior;
Restrições alimentares: assim como no caso de diabéticos, outras restrições podem influenciar na oferta da dieta enteral: intolerância a determinados alimentos como glúten ou lactose devem ser considerados. Da mesma forma, necessidades especiais como maior aporte de fibras, de vitaminas ou sais minerais específicos devem ser contemplados pela dieta.
Existe ainda a adoção de uma dieta padrão, para indivíduos que não possuem necessidades específicas e precisam apenas manter o estado nutricional estável. Em todos os casos, é extremamente importante seguir as orientações médicas quanto aos cuidados necessários durante o preparo, administração e intervalo entre as refeições ofertadas via sonda.
A indicação da dieta mais adequada, artesanal ou industrial, depende de diversos fatores que serão analisados pelo médico/nutricionista em conjunto com o paciente, familiares e cuidadores levando em consideração fatores como: necessidades nutricionais, estilo de vida, rotina e até mesmo o custo da dieta. De acordo com Joanna Lima, quando bem administradas, ambas são capazes de cumprir o seu papel. Porém, alguns pontos as diferenciam e podem indicar qual se adaptará melhor ao tratamento.
Um dos fatores mais relevantes é que essa alimentação não pode ser conservada por longos períodos. As dietas enterais artesanais são feitas a partir de ingredientes totalmente naturais, e por estarem sujeitos à ação de microrganismos, não podem ser armazenadas por mais de 24 horas. O mesmo ocorre com as dietas industrializadas, que possuem um prazo limitado de conservação após aberta.
De acordo com a nutricionista, como ambas não podem ser armazenadas para o dia seguinte, o fator que pode indicar qual a mais adaptável à rotina do paciente é a viabilidade do preparo: “No caso da dieta enteral caseira, deve-se considerar a necessidade de preparar novas refeições todos os dias. Para pessoas que possuem rotina corrida e não dispõem de uma pessoa dedicada à essa tarefa, a dieta industrializada pode ser uma opção mais prática e segura, ainda que também possua prazo de conservação limitado após aberta”.
Deve-se considerar também o custo total da dieta. Ainda que a escolha pela dieta caseira pareça ser menos custosa num primeiro momento, é importante lembrar que a alimentação artesanal deve ser preparada diariamente com alimentos frescos e, em alguns casos, suplementos específicos. Por outro lado, os produtos industrializados geralmente não necessitam de complemento alimentar, pois atendem aos mais variados tipos de necessidades nutricionais.
Além disso, outra questão de extrema importância para os pacientes de terapia enteral tem total relação com a dieta: a higienização. Em ambas as dietas é preciso extremo cuidado na manipulação, seja dos alimentos a serem preparados, seja dos produtos a serem ofertados. As orientações do médico/nutricionista abrangem uma série de cuidados de higiene e esterilização dos utensílios, alimentos e produtos – e a dieta artesanal, em comparação com a industrializada, por possuir mais processos, requer cuidados ainda maiores quanto ao seu preparo, exigindo maior tempo de preparo não apenas do alimento, mas do ambiente no qual ele será manipulado.
“Do ponto de vista nutricional, a dieta artesanal, quando de acordo com as orientações médicas, é tão completa quanto a industrializada. Por outro lado, a industrializada é mais prática, especialmente para aqueles que não dispõem de tempo para preparar novas refeições todos os dias. Em todo caso, inúmeros fatores são considerados em conjunto com o paciente antes de indicar qual a mais adequada para sua rotina””, diz a profissional da Nova Nutrii, ao complementar que o médico/nutricionista pode mudar tipo de dieta indicado conforme a evolução do tratamento, por isso é imprescindível fazer o acompanhamento médico regular.
Alguns pontos são indispensáveis e devem ser seguidos para dar maior segurança e qualidade de vida ao paciente. Independentemente do tipo de dieta, é importante destacar:
A dieta deve ser administrada sempre em temperatura tolerável ao paciente (próximo da temperatura ambiente). No caso da industrializada, após aberta, deve ser armazenada na geladeira por até 24h;
Não aqueça as dietas, qualquer manipulação pode interferir na qualidade e na oferta nutricional do alimento. O mesmo vale para as preparações caseiras;
Higienizar os alimentos, os utensílios, o ambiente de preparo e as embalagens dos produtos é um passo indispensável para reduzir o risco de contaminação da dieta, bem como armazená-los em local apropriado;
Siga atentamente as recomendações da dieta quanto à volumes/horários da dieta e descarte todo o volume que não foi administrado no dia, não a armazene para uso no dia seguinte;
Da mesma forma, a higienização dos dedos, mãos antebraços é fundamental. Nunca utilize acessórios como anéis e pulseiras durante o preparo e manipulação da dieta, mesmo a industrializada;
Diante de qualquer intercorrência, procure auxílio médico.