Butantan inicia testes da vacina contra a dengue em Fortaleza
Começaram hoje em Fortaleza, capital do Ceará, os testes em humanos da primeira vacina brasileira contra a dengue, desenvolvida pelo Instituto Butantan, órgão da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo e um dos maiores centros de pesquisa biomédica do mundo.
Cerca de 1,2 mil fortalezenses de 2 a 59 anos devem participar do estudo, que integra a terceira e última etapa de testes antes de a vacina ser submetida à aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) para que possa ser produzida em larga escala pelo Butantan e disponibilizada para campanhas de imunização em massa na rede pública de saúde em todo o Brasil.
Em Fortaleza, os ensaios clínicos serão conduzidos pelo pesquisador Ivo Castelo Branco, do Hospital Universitário Walter Cantídio, ligado à Universidade Federal de Fortaleza. A vacinação e o acompanhamento dos voluntários acontecerão no próprio hospital.
O Ceará será o primeiro Estado da região Nordeste a receber os testes clínicos da vacina, que posteriormente ocorrerão em Recife (PE) e Aracaju (SE). As testagens já estão em andamento em Manaus (AM) e Boa Vista (RR), em mais dois centros no Estado de São Paulo (Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP e Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto) e na última sexta-feira, 22, tiveram início em Porto Velho (RO). Com isso, os ensaios clínicos estarão em andamento em seis dos 14 centros de pesquisa credenciados pelo Butantan para a realização dos estudos (confira relação completa abaixo).
Ao todo, os testes envolverão 17 mil voluntários em 13 cidades nas cinco regiões do Brasil. São convidadas a participar do estudo pessoas saudáveis, que já tiveram ou não dengue em algum momento da vida e que se enquadrem em três faixas etárias: 2 a 6 anos, 7 a 17 anos e 18 a 59 anos. Os participantes do estudo são acompanhados pela equipe médica por um período de cinco anos para verificar a duração da proteção oferecida pela vacina.
A vacina do Butantan, desenvolvida em parceria com os Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH, na sigla em inglês), é produzida com vírus vivos, mas geneticamente atenuados, isto é, enfraquecidos.
“Com os vírus vivos, a resposta imunológica tende a ser mais forte, mas, como estão enfraquecidos, eles não têm potencial para provocar a doença. A vacina deve proteger contra os quatro sorotipos da dengue com uma única dose”, explica o diretor do Instituto Butantan, Jorge Kalil.
Nesta última etapa da pesquisa, os estudos visam comprovar a eficácia da vacina. Do total de voluntários, 2/3 receberão a vacina e 1/3 receberá placebo, uma substância com as mesmas características da vacina, mas sem os vírus, ou seja, sem efeito. Nem a equipe médica nem o participante saberão quais voluntários receberam a vacina e quais receberam o placebo. O objetivo é descobrir, mais à frente, a partir de exames coletados dos voluntários, se quem tomou a vacina ficou protegido e quem tomou o placebo contraiu a doença.
Os dados disponíveis até agora das duas primeiras fases indicam que a vacina é segura, que induz o organismo a produzir anticorpos de maneira equilibrada contra os quatro vírus da dengue e que é potencialmente eficaz.
“A dengue é uma doença endêmica no Brasil e em mais de 100 países. A vacina brasileira produzida pelo Butantan, um centro estadual de excelência reconhecido internacionalmente, será certamente uma importante arma de prevenção, protegendo nossa população contra a doença e suas complicações”, afirma o secretário de Estado da Saúde de São Paulo, David Uip.
Em 2008, o Instituto Butantan firmou parceria de colaboração com o NIH, passando a desenvolver, no Brasil, uma vacina similar a uma das estudadas pelo instituto americano, composta pelos quatro tipos de vírus da dengue.
Um dos grandes avanços do Butantan no desenvolvimento da vacina foi a formulação liofilizada (em pó), que garante a estabilidade necessária para manter os vírus vivos em temperaturas não tão frias, permitindo seu armazenamento em sistemas de refrigeração comum, como geladeiras, além de aumentar o período de validade da vacina (um ano).
Nas etapas anteriores, a vacina foi testada em 900 pessoas: 600 na primeira fase de testes clínicos, realizada nos Estados Unidos pelo NIH, e 300 na segunda etapa, realizada na cidade de São Paulo em parceria com a Faculdade de Medicina da USP (através do Hospital das Clínicas e do Instituto da Criança) e com o Instituto Adolfo Lutz.
O Instituto Butantan tem um fábrica de pequena escala para a vacina da dengue pronta e equipada para produzir 500 mil doses por ano, capacidade que pode ser aumentada para até 12 milhões de doses/ano com algumas adaptações industriais. O Butantan também tem em projeto a construção de uma planta de larga escala que poderá fabricar 60 milhões de doses/ano.
Ter a vacina desenvolvida e produzida por um produtor público nacional é uma vantagem competitiva para o Brasil, pois garante a disponibilidade do produto, permitindo a autossuficiência produtiva, além de garantir preços mais acessíveis