Impulso à peregrinação!
Luiz Carlos Ferraz
Na esteira do êxito pelas comemorações do 8º centenário da peregrinação de Francisco, de Assis a Santiago de Compostela, o Caminho de Santiago, na Espanha, foi contemplado em julho com um magnífico impulso internacional. Após uma expectativa de mais de 20 anos, finalmente o Comitê do Patrimônio Mundial da Unesco, a Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura, reunido em Bonn, na Alemanha, estendeu o status de Patrimônio Mundial aos quatro Caminhos de Santiago que movimentam o Norte do país. Desde 1993, a classificação envolvia apenas o Caminho Francês, com seus 800 quilômetros a partir de Saint Jean Pied de Port, na França – o mais conhecido entre os Caminhos que há 12 séculos inspiram a veneração às relíquias de Tiago Maior, um dos 12 apóstolos de Jesus, que formam uma das três principais rotas de peregrinação do mundo cristão, ao lado de Jerusalém e Roma.
O reconhecimento projeta a perspectiva de investimentos na restauração do rico patrimônio artístico, histórico, arquitetônico, cultural da região – que envolve diversas Províncias, como Vizcaya, Cantábria, La Rioja, Astúrias, Lugo e A Coruña, estas duas que formam a Galícia – e corrige um erro fundamental. A partir de agora, está elevado à categoria de Patrimônio Mundial o Caminho Primitivo, o primeiro entre os Caminhos de Santiago. Junto com o Primitivo – que tive o entusiasmo de peregrinar em junho passado –, passaram a ser Patrimônio Mundial o Caminho do Norte, de Irún a Arzúa, quando se encontra com o Caminho Francês; o Caminho Vasco Riojano, de Irún até Santo Domingo de la Calzada, seguindo pelo Caminho Francês; e o Caminho de Liébana, um trecho de grande interesse, que liga San Vicente de la Barquera, no Caminho do Norte, ao Mosteiro de Santo Toríbio de Liébana. O monge Toríbio de Astorga viveu em meados do século VIII e em 776 escreveu o livro “Comentário sobre o Apocalipse” para explicar o incrível texto de São João. Também é de sua autoria o hino litúrgico “O Dei Verbum”, no qual chama Santiago, muito antes de serem encontradas suas relíquias, de “cabeça de ouro refulgente da Espanha” e “nosso protetor e patrono especial”.
Os passos do rei Alfonso II
Inaugurei a série de peregrinações a Santiago de Compostela em 2009 pelos 800 quilômetros do Caminho Francês, a partir de Saint Jean Pied de Port. Em 2010, Ano Santo Compostelano, percorri os 240 quilômetros do Caminho Português, desde Oporto, e dois anos depois, em 2012, atravessei os 180 quilômetros do Caminho Aragonês, no trecho entre Somport, nos Pirineus, a Puente la Reina. Em 2013, desafiei os 420 quilômetros do Caminho Sanabrês, desde Zamora, na Vía de la Plata.
Este ano era o momento de corrigir o que considerava uma falha, de ainda não ter peregrinado o primeiro dos Caminhos de Santiago, o Primitivo, com cerca de 320 quilômetros, que atravessa a Cordilheira Cantábrica, entre Oviedo, no Principado das Astúrias, e Santiago de Compostela. Afinal, é uma máxima no Caminho:
– Quien va a Compostela y no visita al Salvador, honra al criado y se olvida del Señor.
A frase alude à Catedral de San Salvador de Oviedo, cuja Câmara Santa guarda inúmeras relíquias, como uma das duas peças do Santo Sudário, a que protegeu a cabeça de Jesus após sua crucificação – a outra, que abrigou o corpo de Jesus, está em Turim, na Itália.
Em junho enfrentei o desafio, que será relatado em livro, com a perspectiva de repetir os passos de Alfonso II, o Casto (759/760 – 842), rei das Astúrias de 791 a 842. Conta a tradição que no primeiro terço do século IX (possivelmente, entre 815 e 825) o sepulcro de pedra com três corpos, do apóstolo Tiago Maior e seus discípulos Teodoro e Atanásio, foi descoberto pelo eremita Pelayo (ou Paio), que comunicou o bispo Teodomiro, de Iria Flávia. Este acionou o rei Alfonso II, que saiu da capital do reino, em Oviedo, e com seu séquito foi até a região que viria a ser chamada de Campus Stelae, ou Compostela, onde mandou construir uma igreja, hoje a fantástica Catedral – dando início ao fenômeno da peregrinação…
Mistérios nas pedras do Caminho
Minhas peregrinações geraram a publicação de quatro livros: a trilogia “Pedras do Caminho” (“Meu Encontro no Caminho de Santiago”, “Sentido do Perdão” e “Busca sem Fim”) e “Descobrindo novos Caminhos”, que iniciou nova série sobre outros Caminhos de Santiago – e que terá seu segundo momento com “Passos do Amor”, com lançamento programado para este ano, que aborda a célebre peregrinação de São Francisco, realizada em 1214, de Assis a Santiago de Compostela – um trajeto de 2.500 quilômetros, que reconstitui em 2014, de trem, ônibus, carro, em companhia de minha esposa, a jornalista Sandra Netto. Os títulos estão à venda na Realejo Livros, no Gonzaga, em Santos, ou pelo e-mail titan.com@uol.com.br
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