Regime de separação total de bens e o direito sucessório
Gelcy Bueno Alves Martins
O Código Civil Brasileiro (Lei nº 10.406/2002) estabelece cinco modalidades de regimes de bens: (i) comunhão universal; (ii) comunhão parcial; (iii) separação total; (iv) separação obrigatória; e (v) participação final nos aquestos.
Os cônjuges ou companheiros podem escolher livremente o regime de bens (art. 1639, do Código Civil), salvo as disposições legais obrigatórias da adoção do regime de separação obrigatória de bens, previstas nos artigos 1.641 e seguintes da mesma codificação.
O mote do presente artigo é o regime da separação total (convencional) de bens e os efeitos jurídicos dos bens do cônjuge falecido.
É bem verdade que a Lei Civil vislumbra a livre negociação patrimonial por força do pacto antenupcial enaltecendo a autonomia privada da vontade das partes na escolha do regime de bens. No entanto, o pacto antenupcial não pode invadir a seara do Direito Sucessório.
Assim, o pacto antenupcial celebrado no regime de separação convencional somente dispõe acerca da incomunicabilidade de bens e o seu modo de administração no curso do casamento, não produzindo efeitos após a morte por inexistir no ordenamento brasileiro previsão de ultratividade do regime patrimonial apta a emprestar eficácia póstuma ao regime matrimonial.
O artigo 1.829, I, do Código Civil de 2002, versa sobre a concorrência do cônjuge com os descendentes na sucessão hereditária, nos seguintes termos:
“Art. 1.829. A sucessão legítima defere-se na ordem seguinte:
I – aos descendentes, em concorrência com o cônjuge sobrevivente, salvo se casado este com o falecido no regime da comunhão universal, ou no da separação obrigatória de bens (art. 1.640, parágrafo único); ou se, no regime da comunhão parcial, o autor da herança não houver deixado bens particulares; (…)”.
O dispositivo legal deixa expresso que, como regra geral na sucessão legítima, o cônjuge sobrevivente concorre com os herdeiros, ressalvados, tão somente, os casos expressamente referidos – casamento pelo regime da comunhão universal, da separação obrigatória ou da comunhão parcial quando o autor da herança não houver deixado bens particulares.
O STJ firmou entendimento no sentido de que o concurso hereditário na separação convencional se impõe como norma de ordem pública, sendo nula qualquer convenção em sentido contrário, especialmente porque o referido regime não foi arrolado como exceção à regra da concorrência posta no art. 1.829, I, do Código Civil.
Conclui-se, portanto, que o cônjuge sobrevivente é herdeiro necessário, qualquer que seja o regime de bens do casamento, e se este for o da separação convencional, ele concorrerá com os descendentes à herança do falecido.
Gelcy Bueno Alves Martins é advogada do escritório Murray – Advogados, de São Paulo.