MP 1.040 e a prescrição intercorrente
Gelcy Bueno Alves Martins
O presidente da República, Jair Bolsonaro, editou a Medida Provisória 1.040/2021, com o objetivo de facilitar abertura de empresas, favorecer o ambiente de negócios e melhorar a posição do Brasil no ranking Doing Business, do Banco Mundial. A MP foi publicada no Diário Oficial da União de 30/03. A ideia é simplificar processos, como a abertura de empresas, o comércio exterior de bens e serviços, a execução de dívidas e a proteção a acionistas minoritários.
Além das questões mencionadas, a MP faz alteração pontual do Código Civil com o objetivo de cristalizar o instituto da prescrição intercorrente já consagrado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na Súmula 150, contribuindo, dessa forma, para o aumento da segurança jurídica.
A MP dispõe sobre a prescrição intercorrente mediante a inserção, no Código Civil, do art. 206-A, cujo teor é o seguinte: “A prescrição intercorrente observará o mesmo prazo de prescrição da pretensão”.
Sabemos que prescrição intercorrente atinge sempre a pretensão executiva e nem sempre está vinculada a um quadro de inércia do credor. A pretensão original, que nasceu com o inadimplemento da obrigação, já foi exercitada pelo credor mediante a propositura da demanda.
Analisando o alcance do novo dispositivo (art. 206-A do CC), concluímos que o texto normativo pretendeu orientar quanto à identificação do prazo para que a prescrição intercorrente ocorra. Assim, o sentido do texto é de que o prazo para consumação da prescrição intercorrente é o mesmo prazo legalmente previsto para prescrição da pretensão original, que foi exercitada por meio da propositura da demanda.
No entanto, o que a norma trouxe de inovação é tão somente o suporte fático para deflagração do prazo para se pleitear a prescrição intercorrente. Isto porque há muito tempo, como acima assinalado, o STF inseriu na sua súmula comum, o enunciado 150, segundo o qual “prescreve a execução no mesmo prazo de prescrição da ação” e a jurisprudência já era uníssona quanto a esse entendimento. Porém, a legislação era omissa quanto a esse prazo.
Embora o instituto tenha sido disciplinado pela Lei nº 6.830/1980, a Lei de Execução Fiscal (LEF), especialmente no seu art. 40, a lei material nada dispunha sobre a prescrição intercorrente e o prazo para a sua consumação.
Conclui-se, portanto, que a inclusão do art. 206-A no CC não promove qualquer alteração na ordem jurídica. Isto porque, como dito acima, o sentido a ser extraído do novo texto normativo é o de que o prazo para consumação da prescrição intercorrente é o mesmo prazo legalmente previsto para prescrição da pretensão original, que foi exercitada por meio da propositura da demanda. O enunciado do novo artigo tem a serventia, apenas e tão somente, de inserir, em texto legal, norma cuja existência na ordem jurídica já era percebida há muito tempo pelo intérprete, mas o intérprete não tinha à sua disposição um texto para se apoiar.
O caso é, portanto, de mera inovação de texto, e não de inovação normativa.
Gelcy Bueno Alves Martins é advogada do escritório Murray – Advogados, de São Paulo.