Panorama sombrio sobre a qualidade da água no estado de São Paulo
Estudo realizado pela Fundação SOS Mata Atlântica apresenta panorama preocupante sobre a qualidade da água em rios, córregos e lagos de bacias hidrográficas do bioma no Estado de São Paulo. Apenas 3% dos 134 pontos de coleta avaliados possuem qualidade boa, enquanto 59% estão em situação regular e 38% com qualidade ruim ou péssima. Isso significa que 51 pontos monitorados estão impróprios para o abastecimento humano, lazer, pesca, produção de alimentos, além de não terem condições de abrigar vida aquática. Nenhum dos pontos analisados foi avaliado como ótimo.
O levantamento foi realizado em mais de 20 municípios entre março de 2016 e fevereiro passado, com base nas coletas e análises mensais de água realizadas por voluntários. Esses grupos integram o programa “Observando os Rios”, por meio do qual a ONG capacita a população para o monitoramento da qualidade da água, e tem patrocínio da Ypê.
O estudo completo e a lista de rios avaliados estão disponíveis em http://bit.ly/qualiagua Também confira os mapas dos estados e pontos avaliados em https://goo.gl/ieph06
Um exemplo prático da aplicação das análises feitas pelos grupos que fazem parte do projeto é o trabalho realizado no Rio Congonhal, em Embu Guaçu. Por meio de denúncia feita por um morador da região onde a análise é realizada, foi detectado e provado que o esgoto de um importante condomínio estava sendo descartado diretamente na água, o que ajudou a solucionar o problema. “Temos certeza que a análise salvou o rio de uma grave contaminação. Nosso carinho pelo projeto cresce a cada dia”, diz a participante do Observando os Rios Estefânia Momm, da ONG Aramitan.
Para a especialista em Recursos Hídricos da Fundação SOS Mata Atlântica, Malu Ribeiro, a causa principal da poluição dos rios monitorados é o despejo de esgoto doméstico, além de outras fontes difusas de contaminação, que incluem a gestão inadequada dos resíduos sólidos, o uso de defensivos e insumos agrícolas, o desmatamento e o uso desordenado do solo.
Segundo ela, a qualidade regular em 59% dos pontos é um grave alerta. “É fundamental aperfeiçoar a legislação que trata do enquadramento dos rios, de forma a excluir os de Classe 4 da norma nacional. Essa classe, que na prática permite a existência de rios sem vida por ser extremamente permissiva em relação a poluentes, mantém muitos em condição de qualidade péssima ou ruim, indisponíveis para usos”, acrescenta Malu.
Na cidade de São Paulo, o monitoramento foi realizado em 56 pontos de coleta. Desses, 50% estão indisponíveis para uso, ou seja, com qualidade ruim ou péssima, 48,2% têm qualidade regular e apenas 1,8% apresenta qualidade boa.
O estudo comparou os resultados do monitoramento de 112 pontos fixos de coletas. Para as análises comparativas foram consideradas as médias dos indicadores mensais do Ciclo 2016 (de março de 2015 a fevereiro de 2016) e do Ciclo 2017 (de março de 2016 a fevereiro passado).
Os indicadores apontam uma diminuição de pontos com qualidade ruim, passando de 45 (40,2%) para 41 (36,6%), mas um aumento de locais com água péssima, de um (0,9%) para dois (1,8%). O estudo também destaca um aumento na qualidade regular, passando de 63 (56,3%) para 65 (58%), e nos pontos com qualidade boa, de três (2,7%) para quatro (3,6%).
O ponto localizado no Riacho Água Podre, afluente do Córrego Jaguaré, obteve queda na qualidade, passando de ruim para péssima. Já o afluente do Ribeirão Caulim, por exemplo, passou de qualidade regular para boa.
Na capital, os pontos com qualidade boa e péssima aumentaram, saindo de zero para um (2,1%), assim como o ruim, que antes era de 23 (48,9%), e passou para 24 (51,1%). Por outro lado, os corpos d’água com qualidade regular caíram, passando de 24 (51,1%) para 21 (44,7%).
Alguns pontos de coleta, como o Piscinão, no Pacaembu, que sofre com o despejo do esgoto sem tratamento, e o Pirajussara, que recebe cargas de municípios vizinhos, tiveram queda de qualidade. Por outro lado, o Ribeirão Caulim, localizado em área protegida e vegetação nativa, registra o melhor índice do período.
“O aumento das cargas difusas de poluição (que incluem a gestão inadequada dos resíduos sólidos, o uso de defensivos e insumos agrícolas, o desmatamento e o uso desordenado do solo) nos períodos de chuvas intensas e temporais, além do despejo de esgoto sem tratamento são alguns dos fatores que contribuem para que mais da metade dos rios paulistanos se mantenham indisponíveis para uso”, afirma Malu.
Os dados das análises desse estudo seguem a metodologia de monitoramento por percepção da qualidade da água, especialmente elaborada para a Fundação SOS Mata e que tem como base o Índice de Qualidade da Água (IQA).
Para a medição dos parâmetros definidos no IQA, a SOS Mata Atlântica desenvolveu um kit de análise que é utilizado em campo por voluntários do projeto “Observando os Rios”. Os indicadores apurados são reunidos em um sistema online de dados georreferenciados, que totaliza e disponibiliza o resultado obtido em cada ponto de coleta pelos grupos de monitoramento em tempo real.
São avaliados 16 parâmetros do IQA: temperatura da água, temperatura do ambiente, turbidez, espumas, lixo flutuante, odor, material sedimentável, peixes, larvas e vermes vermelhos, larvas e vermes brancos, coliformes totais, oxigênio dissolvido (OD), demanda bioquímica de oxigênio (DBO), potencial hidrogeniônico (pH), fosfato (PO4) e nitrato (NO3). A totalização dos indicadores medidos resulta na classificação da qualidade da água, em uma escala que varia entre: ótima, boa, regular, ruim e péssima.
O programa surgiu em 1991, com uma campanha que reuniu 1,2 milhão de assinaturas em prol da recuperação do Rio Tietê e originou o primeiro projeto de monitoramento da qualidade da água por voluntários, o “Observando o Tietê”. Para agregar outras bacias hidrográficas, a iniciativa foi ampliada e passou a se chamar “Observando os Rios”. Em nova fase, com o patrocínio da Ypê, o projeto agora tem como objetivo formar 10 grupos de monitoramento da qualidade da água em cada um dos 17 estados da Mata Atlântica. Atualmente, são 212 grupos de monitoramento que analisam a qualidade da água em 257 pontos, 197 rios, em 80 municípios dos estados de SP, RJ, ES, BA, MG, PB, PE, AL, CE, SC, PR, RN e DF envolvendo cerca de 3,4 mil pessoas.