Espaço virtual imaginado remonta à ideia de um mundo distópico
O Museu de Arte Moderna de São Paulo apresenta um ambiente 3D do 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus. A proposta da curadoria de Ariana Nuala, Germano Dushá e Thiago de Paula Souza não foi replicar a exposição física, mas trazer um espaço virtual imaginado, que remonta à ideia de um mundo distópico e expande as possibilidades de reflexão sobre os temas abordados no 38º Panorama. A plataforma (3d.milgraus.mam.org.br) pode ser acessada de forma gratuita e fica em cartaz até 28 de fevereiro, após o encerramento da mostra física.
O projeto parte da conexão entre arte contemporânea e referências da cibercultura. Inspirado na estética dos jogos de videogame em primeira pessoa – games jogados a partir da visão do personagem e controlado por quem joga – o ambiente 3D foi desenhado para ser acessado via computador, proporcionando uma navegação mais interativa e garantindo que a navegação e os recursos gráficos sejam plenamente aproveitados pelo público. Ao acessar a plataforma, os visitantes encontrarão um espaço interativo, com navegação livre, povoado por obras de diferentes artistas.
O espaço expositivo 3D apresenta obras dos artistas Gabriel Massan, Frederico Filippi, Jonas Van & Juno B, Noara Quintana, Marina Woisky, Mestre Nado, Paulo Nimer Pjota, Rafael RG, Rebeca Carapiá e Zimar. Esse conjunto inclui obras originalmente concebidas como mídias digitais ou esculturas digitais e também representações tridimensionais das obras físicas destes artistas.
Gabriel Massan traz uma escultura digital 3D sem título, feita especialmente para o espaço, como uma espécie de totem com diferentes feições e texturas. Jonas Van & Juno B apresentam um objeto 3D intitulado Visage (2024), que é homônimo à videoinstalação que a dupla apresenta na mostra física e faz referência direta ao personagem central ao trabalho em exposição. As obras de Rafael RG e Noara Quintana são estudos 3D dos trabalhos exibidos na mostra física. No caso de Frederico Fillipi, trata-se de uma adaptação do trabalho de vídeo que apresenta no 38º Panorama. Os demais artistas são adaptações participam com transliterações de outras obras físicas, mas que não estão no MAC, alargando ainda mais o universo visual do projeto.
O trio de curadores, que pertence à geração millennial, buscou referências que dialogassem diretamente com o universo dos games e as estéticas digitais, a fim de gerar uma atmosfera imersiva e provocativa. A curadoria explica que este ambiente distópico e imaginado reflete uma visão crítica do presente, ao mesmo tempo que especula sobre cenários alternativos para o futuro.
“O ambiente 3D do 38º Panorama foi pensado como uma forma de experimentar a ideia de um espaço alternativo, um universo distópico que coloca o visitante dentro de uma realidade paralela. A influência dos games, em especial, nos permitiu criar uma experiência interativa, em que as obras estão dispostas de forma a dialogar com esse cenário futurista”, afirmam Ariana, Germano e Thiago.
O ambiente também está incluso no site do 38º Panorama da Arte Brasileira: Mil graus, que reúne diversos conteúdos sobre esta edição da exposição bienal do MAM São Paulo. A plataforma traz informações gerais sobre a mostra, perfis de artistas e coletivos participantes, além de textos dos curadores Germano Dushá, Thiago de Paula Souza e Ariana Nuala, e apresentações institucionais do MAM e MAC USP. O usuário ainda pode conferir imagens de vistas da exposição e baixar wallpapers para celular e desktop com a identidade visual da mostra.
Uma vasta produção audiovisual sobre o Panorama também está inclusa, com videodocumentários de visitas aos ateliês dos artistas Marina Woisky, Zimar, Adriano Amaral, Advânio Lessa e Marlene Almeida, e todos os episódios do podcast Mil Graus, apresentados por Adriana Couto e produzido pela Trovão Mídia em parceria com o MAM.
A proposta curatorial do 38º Panorama da Arte Brasileira é elaborar criticamente a realidade atual do Brasil sob a noção de calor-limite — conceito que alude à uma temperatura em que tudo derrete, desmancha e se transforma. O projeto busca traçar um horizonte multidimensional da produção artística contemporânea brasileira, estabelecendo pontos de contato e contraste entre diversas pesquisas e práticas que, em comum, compartilham uma alta intensidade energética.
A pesquisa da curadoria foi norteada a partir de cinco eixos temáticos: Ecologia geral, Territórios originários, Chumbo tropical, Corpo-aparelhagem, e Transes e travessias. Os eixos não funcionam como núcleo ou segmentos da exposição, mas sim como fios condutores que instigam reflexões e leituras, traçando possíveis relações entre os trabalhos a partir dessas perspectivas.
Em Ecologia geral, são destacadas noções ecológicas e práticas ambientais ampliadas que se orientam por uma visão de interconectividade total. Já em Territórios originários, estão narrativas e vivências de povos originários, quilombolas e outros modos de vida fora da matriz uniformizante do capital, capazes de refletir visões alternativas sobre a invenção e a atual conjuntura do Brasil. Chumbo tropical, por sua vez, trará leituras críticas que subvertem imaginários e representações do Brasil, colocando em xeque aspectos centrais da identidade nacional
Corpo-aparelhagem é a linha que busca evidenciar intervenções experimentais e reflexões sobre a contínua transmutação corpórea dos seres e das coisas, com seus hibridismos e suas inter-relações, enquanto Transes e travessias aborda conhecimentos transcendentais, práticas espirituais e experiências extáticas que canalizam os mistérios vitais.
Em função da reforma da marquise do Parque Ibirapuera no trecho em que o MAM está sediado, esta edição do Panorama está em cartaz no Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, instituição parceira e que divide uma mesma origem com o MAM. A exposição ocupa partes do térreo e o terceiro andar do MAC USP com mais de 130 obras, sendo 79 inéditas, realizadas para o 38º Panorama.
A série de mostras Panorama da Arte Brasileira foi iniciada em 1969 e coincidiu com a instalação do MAM São Paulo em sua sede na marquise do Parque do Ibirapuera. As primeiras edições do Panorama marcaram a história do museu por terem contribuído direta e efetivamente na formação de seu acervo de arte contemporânea. Ao longo das 37 mostras já realizadas, o Panorama do MAM buscou estabelecer diálogos produtivos com diferentes noções sobre a produção artística brasileira, nossa história, cultura e sociedade. Realizado a cada dois anos, sempre produz novas reflexões acerca dos debates mais urgentes da contemporaneidade brasileira.