Brasil cai pelo 3º ano seguido no ranking da Transparência Internacional
O Brasil apresentou em 2018 nova queda no Índice de Percepção da Corrupção (IPC) da Transparência Internacional: o principal indicador de corrupção no setor público do mundo. A nota do país no IPC recuou dois pontos, de 37 em 2017 para 35 pontos, o que fez com que o Brasil perdesse nove posições no ranking global. A escala se estende de zero a 100, e quanto menor o valor, maior a percepção da corrupção.
A pontuação do Brasil foi a menor desde 2012 – ano em que se modificou a metodologia do indicador e passou a ser possível a análise em série histórica – e representou o 3º recuo seguido na comparação anual. Com essa nota, o país empatou com Argélia, Armênia, Costa do Marfim, Egito, El Salvador, Peru, Timor Leste e Zâmbia. A pontuação fez com que o Brasil passasse para a 105ª posição dentre as 180 nações e territórios avaliados pelo IPC – a pior colocação do país dos últimos sete anos.
IPC 2018 | Evolução histórica do Brasil
Ano 2012 2013 2014 2015 2016 2017 2018
Nota 43 42 43 38 40 37 35
Posição 69 72 69 76 79 96 105
O IPC é a mais longeva e abrangente ferramenta de medição da corrupção no mundo. Existe desde 1995, mas seus dados passaram a ser estatisticamente comparáveis ano a ano a partir de 2012. É também a referência para o nível relativo de corrupção nacional mais utilizada no planeta por tomadores de decisão dos setores público e privado para avaliação de riscos e planejamento de suas ações.
Na avaliação da Transparência Internacional – Brasil, o persistente mau desempenho do país no ranking não significa que tudo o que foi feito nos últimos anos para combater a corrupção não teve resultado. É inegável que grandes esquemas de ilícitos e privilégios foram revelados no período recente, principalmente pela operação Lava Jato e seus desdobramentos.
O fato de haver hoje importantes figuras do mundo político e empresarial atrás das grades é uma prova disso. Há de se destacar também que esta sucessão de escândalos e ações de investigação e punição por parte das autoridades federais tende a aumentar, em um primeiro momento, a percepção de que a corrupção está piorando. A tarefa de reverter esta avaliação depende, no entendimento da organização, de uma série de reformas que demonstrem sério comprometimento do país com a eliminação das causas estruturais deste problema social.
“O fato de o Brasil prosseguir com uma performance tão ruim no IPC 2018 é revelador. A Lava Jato teve – e continua a ter – importância vital para romper com a impunidade histórica da corrupção no Brasil, principalmente de réus poderosos. Mas ela sozinha não será capaz de efetivamente reduzir os níveis de corrupção. Para isso será necessário que o Brasil olhe agora para frente na luta contra a corrupção, atacando as raízes do problema com reformas legais e institucionais”, afirma Bruno Brandão, diretor executivo da Transparência Internacional – Brasil.
A experiência de 25 anos da TI em 110 países aponta que, quando o enfrentamento da corrupção avança, seus mecanismos adaptam-se para garantir sua sobrevida. “O resultado ruim deste ano foi certamente influenciado pela total inércia do governo Temer e do Congresso em fazer avançar políticas públicas e reformas anticorrupção – apesar de este ser um tema de prioridade máxima para a população brasileira. Ao contrário, o que se viu foi um presidente e diversos de seus ministros sob acusações gravíssimas de corrupção e tentativas renitentes de garantir a impunidade, como o infame indulto natalino de Temer, beneficiando descaradamente os condenados da Lava Jato. Isto certamente influenciou a percepção no Brasil e no mundo de que os esforços do país na luta contra a corrupção podem não significar ainda uma mudança de patamar e, pior, pode haver retrocessos”, acrescenta Brandão.
“A boa notícia é que temos uma oportunidade única diante de nós. Em 2018, a sociedade brasileira se mobilizou – em um processo facilitado pela Transparência Internacional – Brasil e Fundação Getulio Vargas – e desenvolveu o maior pacote de reformas anticorrupção do mundo. Trata-se das Novas Medidas contra a Corrupção, um pacote de 70 propostas legislativas e regulatórias para realmente atacar as raízes do problema. A campanha “Unidos contra a Corrupção”, também lançada no ano passado em apoio ao pacote, conseguiu reunir o compromisso de 54 parlamentares eleitos – e o número de deputados e senadores que nos procuram para aderir está crescendo. Nosso objetivo é que esta seja a semente de uma frente parlamentar anticorrupção, que fará avançar as reformas propostas pela sociedade”, completa a coordenadora da Transparência Internacional – Brasil, Nicole Verillo.
Sob a coordenação da Transparência Internacional – Brasil e da Fundação Getúlio Vargas, centenas de organizações e especialistas brasileiros produziram em 2018 um amplo pacote de propostas para embasar as grandes reformas estruturais por mais transparência e integridade que o país necessita.
As 70 Novas Medidas contra a Corrupção – o maior pacote anticorrupção do mundo, formado por projetos de lei, propostas de emenda constitucional e resoluções administrativas – obtiveram em 2018 o endosso de centenas de candidatos à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal. Por meio da campanha Unidos Contra a Corrupção, eles demonstraram ao eleitorado seu compromisso com esta agenda reformista, sendo que 41 deputadas/os federais e 13 senadoras/es se elegeram para o novo Parlamento. Agora, a coalizão de organizações sociais que está à frente da iniciativa reunirá esforços para criação de uma frente parlamentar mista suprapartidária que apoie reformas estruturais contra a corrupção.
A Transparência Internacional alerta neste ano para a crise da democracia no mundo e suas implicações negativas para a luta contra a corrupção. Mais que eleições livres e regulares, um ambiente democrático deve ser entendido, segundo a organização, como aquele em que predominam o estado de direito, instituições independentes e sistemas de freios e contrapesos. Muitos países, no entanto, têm enfrentado ondas de autoritarismo e populismo, que têm contribuído para minar a confiança dos cidadãos nos governos, reduzir a participação política e eleitoral e deteriorar a lógica do contrato social. Além disso, a narrativa da luta contra este problema social tem sido indevidamente apropriada por líderes e candidatos com discurso antidemocrático.
Para avaliar o peso deste movimento global, a Transparência Internacional realizou cruzamentos de dados de democracia – o “Democracy Index”, da The Economist Intelligence Unit (EIU), o “Freedom in the World Index”, da Freedom House, e o “Annual Democracy Report” da Varieties of Democracy (V-Dem) – com os próprios resultados do IPC. Conseguiu assim concluir que democracias plenas pontuaram em média 75 no IPC 2018, ao passo que democracias com falhas registraram média de 49. Aqueles regimes considerados híbridos – que já mostram algumas tendências autocráticas – pontuaram 35 em média. Por fim, regimes autocráticos tiveram o pior desempenho médio do ranking, com pontuação média de apenas 30 pontos.
Como exemplos desta correlação, o IPC 2018 destaca a Hungria e a Turquia, cujas notas no IPC recuaram nos últimos cinco anos, respectivamente, 8 e 9 pontos. A Turquia foi rebaixada, no período, da categoria de nação “parcialmente livre” para “não livre”; enquanto a Hungria registrou sua menor pontuação em liberdade de direitos políticos desde a queda do comunismo, em 1989. Essas categorizações refletem a deterioração do Estado de Direito e das instituições democráticas nestes países, bem como o rápido encolhimento do espaço de participação da sociedade civil e da imprensa independente.
Com pontuação de 71, os Estados Unidos perderam 4 pontos ante a nota obtida no IPC de 2017, deixando pela primeira vez desde 2011 o grupo dos 20 países com pontuação mais alta. A pontuação baixa vem em um momento em que os EUA enfrentam ameaças a seu sistema de freios e contrapesos, bem como deterioração de normas éticas no alto escalão do poder. No índice da EIU, o país não figura nem entre os 20 mais democráticos do planeta.
A preocupação com o ambiente democrático no Brasil também existe. Na pesquisa da EIU, citada pelo IPC neste ano, a pontuação nacional é de 6,97 – o que implica que o país é considerado uma “democracia falha”. No Relatório Freedom in The World, o Brasil tem pontuação de 78 em uma escala que vai até 100, indicando situação de “relativa liberdade”.
Em termos de “liberdade de imprensa” especificamente, o Brasil é categorizado como parcialmente livre. Por fim, o Relatório Anual sobre a Democracia aponta que o país está passando por um processo de autocratização, assim como tem ocorrido com Índia, Rússia, Turquia e EUA.
O IPC deste ano apontou, finalmente, que mais de dois terços dos 180 países pesquisados tiveram nota menor que 50, com média global de 43 pontos (a mesma do estudo anterior). Na metodologia do indicador, qualquer nota inferior a 50 revela que o país está falhando em sua luta contra a corrupção.
Em 2018, 65 nações pioraram suas notas, entre as quais o Brasil, ao passo que 55 ficaram estáveis. Somente 60 países demonstraram melhora. O índice divulgado nesta terça-feira revelou que a maioria das nações tem progredido muito vagarosamente rumo a um ambiente mais ético e transparente. Nos últimos sete anos, grande número delas teve pouco ou nenhum progresso.
As descobertas do IPC 2018 reforçam o entendimento de que, tal como se observa no Brasil, o mundo necessita avançar em reformas estruturais para combater as causas da corrupção pela raiz. A TI também conclama os cidadãos do mundo a estarem alertas a soluções autoritárias e discursos populistas para o enfrentamento da corrupção, pois a experiência internacional ensina que o caminho para um controle efetivo e sustentável deste problema social passa necessariamente pela via democrática, com fortalecimento das instituições, das leis e do consenso social sobre o valor da integridade.
O IPC é um índice composto – fruto da combinação de diferentes indicadores, pesquisas e avaliações de corrupção realizadas por várias instituições – que pontua e classifica os países/territórios com base na percepção da corrupção do setor público. A depender da disponibilidade de informações em cada nação pesquisada, são consideradas na elaboração do índice de três a treze fontes de dados.
A Transparência Internacional, em www.transparenciainternacional.org.br é um movimento global com um mesmo propósito: construir um mundo em que governos, empresas e o cotidiano das pessoas estejam livres da corrupção.
Atua no Brasil no apoio e mobilização de grupos locais de combate à corrupção, produção de conhecimento, conscientização e comprometimento de empresas e governos com as melhores práticas globais de transparência e integridade, entre outras atividades.
A presença internacional da TI permite defender iniciativas e legislações contra a corrupção e que governos e empresas efetivamente se submetam a elas. A rede também significa colaboração e inovação, o que dá condições privilegiadas para desenvolver e testar novas soluções anticorrupção.