Nosso Jeca
“Deixei de ser um quarqué
Já não como mais angu
Hoje sou um coroné
Não sou mais Jeca Tatu”
(Mazzaropi)
Luiz Carlos Ferraz
Criado pelo escritor Monteiro Lobato (1882-1948) como a representação do atraso no campo e descrito pelo próprio autor como “funesto parasita da terra”, “homem baldio, inadaptável à civilização”, o personagem Jeca Tatu foi celebrizado por Amácio Mazzaropi, o popular Mazzaropi, fazendo do filme um clássico do cinema nacional. Quis o destino, ao contrário das pretensões literárias de Lobato, ao apresentar o trabalhador rural paulista como um caipira preguiçoso, relegado pelos poderes públicos ao atraso social, cultural e econômico, que o espírito de Jeca Tatu viesse a se tornar muito maior, conquistando a alma do brasileiro comum. Mazzaropi cantou:
“Aqui hoje tem fartura
Tá sobrando até feijão
Bebo leite sem mistura
Como carne e requeijão”
Trazendo esse anacronismo na essência de sua identidade, não soou nada estranho que novos detalhes da tentativa de golpe ao Estado brasileiro, revelados há pouco pela Polícia Federal, tenham trazido à memória o complexo personagem lobatiano. É que na conspiração articulada pelo governo Jair Bolsonaro, denominada “Punhal Verde e Amarelo”, na qual seriam assassinados o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o vice Geraldo Alckmin, e o então presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, os golpistas fizeram gracinha e alcunharam Alckmin de “Joca”, Moraes de “Professora” – assim mesmo, no feminino –, e Lula de “Jeca”. Por ora, foram realizadas novas prisões pelo ataque ao Estado Democrático de Direito, entre as quais de quatro militares de alta patente, um deles general de brigada (2 estrelas) na reserva. Outras virão. Mazzaropi já deixou escrito:
“Se arguma coisa não presta
Isso não vou discuti
Pra mim o azar é festa
O que eu quero é divirti”