Edição 359 Dezembro 2024
Edição 359Dezembro 2024
Segunda, 20 De Janeiro De 2025
Editorias

Publicado na Edição 359 Dezembro 2024

Ainda estou aqui

Luiz Carlos Ferraz

Com a consciência de uma luta ainda maior – por homens e mulheres que simplesmente desapareceram durante a ditadura militar, conforme proposto pelo filme com o título acima –, registro, sem a mínima pretensão de fazer graça, que eu ainda estou aqui. Afinal, ao poder comemorar minha anistia política, concedida em 28 de novembro passado, na última sessão plenária do ano da Comissão da Anistia, do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, está claro que escapei vivo da carnificina conduzida pelo regime de exceção.

Na história recente, quem atravessou a ditadura militar é capaz de compreender o que significa a censura, especialmente no trabalho, nas artes, enfim, nas organizações sociais. Por não ser movimento natural, é compreensível que a tendência de quem a sofreu tenha sido a indignação e a resistência, nem sempre se esperando reações semelhantes de quem apenas a assistiu, como no clássico bordão de que pimenta no olho do outro é colírio. Cruel, a censura perseguiu, prendeu, torturou e matou centenas, milhares, dezenas de milhares de pessoas, não se sabe ao certo… O que se tem certeza é que a prática, institucionalizada no período e cristalizada na ação criminosa dos órgãos que aderiram, permanece hoje no âmago do sofrimento das famílias que choram o desaparecimento daqueles que lutaram pela liberdade, não só da própria, mas de forma ampla, e esperam pacientes uma resposta da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, reinstalada em agosto deste ano pelo MDHC. Sabe-se que a dor jamais terá fim; e não só pela demora no reconhecimento das violações cometidas, mas também pelo surgimento de episódios tão ou mais graves neste contexto de transformações da democracia brasileira, como na recém revelada tentativa de golpe ao final do governo Jair Bolsonaro. Porém, o fato de haver pessoas comprometidas a não esquecer tais atrocidades, mesmo que a narrativa dos setores reacionários da sociedade insista em disseminar mentiras, conforta corações e mentes e mantém acesa a chama que arde silenciosa clamando por Justiça. Aos que teimam em negar, a sugestão é assistir “Ainda estou aqui”, que conta a história de Eunice Paiva, viúva do ex-deputado federal Rubens Paiva, santista ilustre, desaparecido pela ditadura.

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